quinta-feira, 26 de março de 2015

Palestras do governo para recém-chegados

Desde sexta-feira passada, estou num intensivão de palestras do governo para imigrantes recém-chegados. Fui inscrito em duas, ambas quando passei pela salinha do Quebec no aeroporto de Montreal, após fazer meu landing. A funcionária que me atendeu me ofereceu essas palestras e fez minha inscrição na hora, me entregando em seguida as folhinhas impressas com endereço e horário.

A primeira, que foi a da sexta-feira passada, era sobre as etapas de instalação para quem acabou de chegar. Dura três horas, e nela o palestrante fala sobre (quase) tudo: habitação, carteira de motorista, assurance maladie, escola, NAS, conta bancária, auxílios... mas não entra em grandes detalhes sobre nada disso. Você pode fazer perguntas e tudo mais, mas fica claro que a intenção é mostrar para o recém-chegado que existe isso, isso e aquilo no Quebec, e que, se ele quiser se informar mais, deve ir aqui, aqui e ali. Não é algo para eles te pegarem pela mão, analisarem tua situação específica e dizer o que você deve (ou poderia) fazer. Para quem passou anos fazendo pesquisas para o processo, não há muita novidade. Ainda assim, é bom ir para pegar alguns detalhes, tirar dúvidas ou treinar o francês (porque isso nunca é demais).


Objectif intégration

A outra, na verdade, é um ciclo de uma semana que começou, pra mim, na segunda à tarde. Tem sido todos os dias, pela manhã e à tarde, e termina amanhã pela manhã. Essas são as palestras que todo mundo devia ter direito a assistir antes de vir pra cá, talvez até mesmo antes de entrar no processo. Eles botam a real sobre o mercado de trabalho do Quebec, sobre o que é levado em conta numa contratação, sobre os costumes no ambiente de trabalho. Falaram sobre currículo, entrevista, seguro-desemprego, impostos, salário... enfim, um milhão de coisas sobre integração do imigrante ao mercado de trabalho.

Aliás, alguns imigrantes que estão na mesma turma que eu levantaram a peteca de que o programa de imigração é enganoso, que o Quebec faz parecer que tudo é fácil e tralálá, mas que só aqui é que a gente descobre como as coisas são. Resposta do palestrante: realmente, só dá pra sentir na pele quando se está aqui, mas todas as informações que ele passa estão disponíveis na Internet, nos sites do governo, em cartilhas, brochuras e outros meios, e quem planeja e lê para entrar no processo acaba entrando em contato com tudo. De forma que, se você achou que seria fácil, você não pesquisou o suficiente.




Na segunda-feira, parecia que o negócio não ia pra lugar algum. Basicamente, a palestra foi sobre história do Quebec e os valores da sociedade. Mas logo fica evidente que isso é para ambientar quem está chegando de fora (isto é, nós) sobre os motivos de certas coisas serem como são. Aqui e ali você consegue fazer relações entre a história, a sociedade e o modus operandi do mercado de trabalho quebequense. Claro, não dá pra ficar expert no assunto, mas serve pra você ver que há uma razão de ser para as coisas (pelo menos em alguns casos).

Na terça e na quarta, as palestras foram focadas no tal plano de ação personalizado. Basicamente, foi pra deixar claro que é preciso definir qual o seu objetivo profissional aqui, e daí ver se falta algo pra você poder chegar até lá e, em caso afirmativo, como fazer pra atingir o objetivo. Um exemplo que o palestrante deu foi de uma francesa que imigrou para o Quebec e se candidatou a uma vaga de caixa em um banco local. Ela possuía vários anos de experiência atuando em bancos franceses, principalmente em serviços ligados ao atendimento à clientela, mas optou por começar como caixa aqui. Amigos e parentes disseram que ela não precisava começar por baixo devido à fluência no idioma e à experiência profissional, e a resposta dela era que ela realmente tinha tudo isso, mas ela não conhecia o sistema bancário canadense e nem as relações interpessoais aqui. Começando "de baixo", ela teria condições de aprender tudo isso e reconstruir sua carreira aqui, já que seu objetivo era fazer o mesmo que fazia na França.

Obviamente, essa é uma escolha pessoal. Tem gente que não admite dar passos para trás, outros precisam estudar para obter condições de se candidatar a um emprego, e há ainda aqueles que resolvem mudar totalmente de carreira. Em cada caso, um objetivo, e, para cada objetivo, um caminho diferente a seguir. Esse é a mais ou menos o resumo desses dois dias de palestra.

Hoje foi basicamente sobre aspectos legais do trabalho. Uma coisa que eu particularmente não sabia é que nem sempre há contrato de trabalho. Você pode trabalhar sem contrato e, ainda assim, estar dentro da lei (desde que o empregador e você mesmo paguem seus impostos e cumpram o estabelecido, claro). Quando não há contrato firmado, aplicam-se as leis trabalhistas mínimas, uma espécie de contrato geral estabelecido por lei que dita qual é o mínimo em cada aspecto do trabalho (salário, folgas, férias, seguro, etc).

O último módulo será amanhã, e vai cobrir as oportunidades de emprego fora de Montreal. Há um esforço do governo para que as pessoas escolham outras cidades que não Montreal, já que a concorrência aqui é grande e tende a aumentar ainda mais com os imigrantes chegando e se estabelecendo aqui. Então acho que amanhã rola um jabá de Trois-Rivières e companhia.


Vale a pena participar das palestras?

Que fique bem claro que essas palestras não são obrigatórias. No aeroporto, eu poderia ter dito "não, moça, não quero participar não, brigado" ou ˜valeu, mas eu tenho outras coisas pra fazer (tipo postar fotos no Facebook pra mostrar que eu cheguei), então vou me inscrever depois˜. Aliás, quem não chega por Montreal ou quem chega em horários, digamos, pouco convencionais (tipo três da manhã) não "ganha" inscrição direto nas palestras. Precisa ligar e marcar, se quiser participar.

Mas eu aconselho todo mundo a participar. Além de dar uma relembrada em muita coisa que você provavelmente já viu nas pesquisas, com certeza uma ou outra coisa será nova pra você. E com o bônus de você poder tirar alguma dúvida mais específica com a pessoa ali, na hora. Há muita, muita informação mesmo, mas eles dão material impresso (folhas impressas, apostilas, etc) que permitem que você reveja tudo em casa. E nesse material você sempre encontra telefone e página na Internet de cada órgão responsável por cada assunto. Quem conhece o guia Apprendre le Québec já tem uma noção boa de como isso funciona.

Embora as informações sejam úteis e tal, não dá pra negar que é muita coisa pra quem está chegando e ainda não conseguiu nem entender pra que lado é o metrô. Ainda assim, se você não conseguir assimilar nada ou achar tudo muito chato, vale, pelo menos, para praticar o francês. Bien entendu, as palestras são todas em francês, e os sotaques variam muito. Na minha turma, sou o único brasileiro. Tem uma colombiana, um chinês, um casal de iranianos (que sumiu desde ontem), e o restante é composto de argelinos e marroquinos. Então a parabólica das zureba é forçada a ficar tentando sintonizar cada sotaque pra poder entender tudo. E foi justamente lá que consegui começar a falar com mais calma desde que cheguei. Acho que estar num ambiente mais informal ajudou bastante. Eu fico quietinho no meu canto, mas quando sou chamado a participar, participo. Ontem um argelino até resolveu que queria conversar comigo e passou o horário do almoço inteiro batendo papo. O sotaque é punk virado no cão, mas, depois de um tempinho, as parabólicas se ajeitam e a coisa flui melhor.

Ah, uma coisa que é pisada e repisada nas palestras é a importância do trabalho voluntário e do networking (ou résautage). Em todos os tópicos, esses dois itens sempre voltam à pauta, de modo que é bom tê-los sempre em mente em terras canadenses.

Mesmo sendo útil, confesso que não vejo a hora do negócio acabar amanhã. Tenho que continuar procurando apartamento (assunto para outro post) e começar/terminar/continuar uma série de outras coisas pra cujo tempo tem sido escasso por causa dessas palestras. Mas courage, tá logo ali.

À bientôt!

7 comentários:

  1. Essa vida nao eh mole nao hahaha... acabei de passar por td isso... Hoje foi o ultimo dia pra mim tb... pra mim o melhor de td foi a minha turma.. muito legal.. alias se quiser, podemos trocar figurinhas...

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    1. Minha turma também era legal, Paula, mas formaram umas panelinhas pra falar árabe que realmente não deixaram chance hehehe. E podemos trocar figurinhas, sim! Escreve pro rodryerto@gmail.com

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    2. Ta otimo! vou enviar jaja!
      ate breve :)

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  2. Muito bom seu post tão detalhado. Legal saber como essas palestras funcionam. O que eles falaram sobre quantidade de empregos no interior de Québec? Não é mais difícil conseguir trabalho nesses lugares não? Simpatizamos muito com Sherbrooke.
    Abraço!

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    1. Oi, Porcelets! Olha, eles não chegaram a falar sobre a quantidade de empregos, mas bateram na tecla de que a concorrência é bem menor que em Montreal pra praticamente qualquer área. E isso não só porque a maioria esmagadora dos imigrantes escolhe se estabelecer em Montreal, mas porque os jovens de outras cidades do Quebec acabam também querendo vir pra cá. Só que, no caso destes, tem todo um lado de ter crescido em cidade menor e querer conhecer cidade grande, experimentar, estudar e tal, o que difere bastante do perfil da maioria dos imigrantes, que já tem família, já vem de uma cidade grande e quer, basicamente, arrumar um emprego e tocar a vida. Então ficou claro que, pra esse objetivo, uma cidade fora da região de Montreal oferece mais chances, e conta inclusive com alguns incentivos do governo (podem pagar as despesas pra você ir fazer sua entrevista, por exemplo).

      Quanto à dificuldade de arrumar emprego, vai depender da área. Na apostila dele curso, há uma parte sobre as outras regiões do Quebec com as principais atividades de cada uma. Então vale fazer pesquisas desde já. Montreal concentra mais ofertas de emprego, mas a concorrência é muito, muito maior. Eu pensei várias vezes vezes, durante o processo, em ir pra outro lugar, mas como resolvi passar o primeiro ano estudando (e ainda estou analisando minhas opções), resolvi ficar aqui num primeiro momento.

      Abraço!

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  3. Doug,
    Que instituição vc se inscreveu?
    Me passa o endereço ou contato.

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    1. Oi, Diário! Taí os lugares que eu frequentei. Mas vale lembrar que eu fui inscrito pelo pessoal do aeroporto quando cheguei, e eles usaram meu endereço como base, já que há vários centros que oferecem essas palestras. Mas aí vai:

      Palestra Premières démarches
      Clef pour l'intégration au travail des immigrants
      1595, rue Saint-Hubert
      Bureau 300

      Palestra Objectif intégration
      Collectif des femmes immigrantes du Québec
      7355, boulevard Saint-Michel
      Bureau 102 (metrô Saint-Michel)

      Abraço!

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